O Silêncio dos Que Não Sentem

Há um silêncio que ecoa mais alto do que qualquer grito. Um silêncio que não é ausência de som, mas de presença. Uma ausência que se instala nos quartos vazios dos hospitais, nos corredores onde a esperança é uma piada mal contada. E, no entanto, ninguém se incomoda. O mundo segue o seu curso, indiferente como uma máquina bem ajustada.

Antigamente, dizia-se que a dor compartilhada era uma dor diminuída. Mas talvez isso seja uma mentira repetida tantas vezes que virou consolo barato. Hoje, a dor é um fardo solitário, um grito mudo abafado pela superficialidade de uma vida onde as relações se tornaram tão rasas quanto um pires. O sofrimento alheio é uma perturbação, algo a ser ignorado para não manchar o dia ensolarado de quem passa.

Na era das conexões instantâneas, ninguém parece se importar. Amigos que se tornam invisíveis. Famílias que esquecem suas raízes. Aqueles que antes eram presença constante agora são apenas números em uma lista de contatos. A notícia chega – uma doença terminal, uma despedida iminente – mas não há resposta. Silêncio.

O abraço virou um emoji. A palavra de conforto, uma reação automática em uma postagem. A dor do outro tornou-se um incômodo, uma interrupção no fluxo das próprias preocupações. Que se dane o sofrimento alheio, parece dizer a humanidade, enquanto desvia o olhar.

E talvez seja isso: o sofrimento hoje é como uma doença contagiosa. Todos fogem, temendo ser infectados. Mas não é o câncer, o luto, ou a morte que assusta. É a dor de se importar. É o risco de sentir.

Há quem diga que o amor se esfriou, mas talvez seja pior. Talvez ele apenas tenha sido substituído por uma versão rasa, sem profundidade, sem compromisso. E, assim, continuamos a existir, mas não a viver. Cruzamos com os outros, mas nunca os tocamos. E no silêncio dos que não sentem, morremos todos um pouco.

Renato Paes Leme

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